EM DIA DE ABRIL SEM ÁGUAS DE MIL MAS COM MOLINHA PARA QUE O COMBOIO DO DOURO VOLTE APITAR ATÉ BARCA D’ALVA
Quando se deseja a chuva, ela não cai dos céus – E, da maneira que o ano tem ido seco, já que não choveu em Janeiro, Fevereiro e Março, que o Abril traga águas de mil – Mas que dêem para matar a sede dos campos, façam transbordar ribeiros e ribeiras e, contrariando o velho ditado popular, que não caibam todas num barril
Esperava-se uma manhã de sol – aliás, assim prometia a meteorologia – Que o Sábado e o Domingo de Páscoa, iam mostrar um Abril sorridente e banhado de luz – Mas, afinal, só o dia de Páscoa, mereceu de São Pedro essa divina graça – Foi, de facto, um Sábado cinzento e molhado. Ao menos que chovesse a valer, que bem se precisava. Mas a chuva nunca vem quando mais se deseja. E, quando cai miudinha, até existe o perigo acrescido para quem conduz na estrada - e acidentes não faltaram. De tarde o tempo ainda levantou mas a manhã foi realmente cinzenta e com aquele género de aguaceiros que nem dão para regar as hortas nem matam a sede aos campos, mas que toldam os céus e fazem com que os rostos mais contemplativos, se tornem ainda mais pensativos ou até mesmo sorumbáticos e tristes - Além de se molharem as calças nas ervas (e se poderem dar algumas escorregadelas) a quem, nesses dias, se atreva a devassar a natureza. E, então, no trilho de uma antiga linha de caminho de ferro, ainda pior. E foi os riscos que não quis correr centena e meia de amantes da natura, que pugnam pela reabertura da linha do Pocinho a Barca D’Alva. Num passeio pedonal organizado pela Associação Foz Côa Friends.
QUEM CORRE POR GOSTO NÃO CANSA - MESMO QUE TENHA DE SE LEVANTAR MAIS CEDO DE QUE O CANTAR DO GALO.
Sete e meia da manhã na Praça do Município, frente ao Café do Zé Pilério, que se levantara cedinho e fizera questão de dar as boas-vindas a todos os amigos. Dois autocarros, esperavam-nos para nos conduzirem até à velha estação do Côa e, dali, se fazer o percurso a pé à de Almendra. Este era o programa inicial, mas o tempo trocou-nos as voltas e houve que alterá-lo. E, então àquela hora, quem é que era capaz de adivinhar como o dia se iria portar?... Jogou-se pelo seguro. José Ribeiro, João Pala, Lebreiro e Pilério e outros dirigentes da Foz Côa Friends, haviam pensado tudo ao pormenor e até num plano b como alternativa, caso o tempo nos pregasse alguma partida – Por isso, ninguém arredou pé - Adiou-se o passeio pela linha para outra oportunidade e lá se rumou em direcção à velha estação de Almendra, em dois autocarros gentilmente postos à disposição pela Câmara Municipal de Vila Nova de Foz Côa.
LÁ ESTAVA A VELHA ESTAÇÃO – CONTRASTAR O SEU ABANDONO, NUM LOCAL TÃO MARAVILHOSO - QUE NOUTRO TEMPO TIVERA MOVIMENTO E VIDA – E, AGORA, ESVENTRADA, EM RUÍNAS, ALBERGUE DE “ÍNDIOS” LIA-SE LÁ NUMA DAS MUITAS GRAFITES QUE COBREM AS PAREDES.
“Salvé” “Só os teus olhos me fazem sonhar e cagar” – Outra das muitas expressões e desabafos, que a arte dos corações mais sensíveis ou atormentados, não deixaram de ali perpetuar nas paredes brancas das várias instalações que constituíam a velha estação de Almendra – Talvez por isso, mas sobretudo pelo gritante contraste com a beleza envolvente, até parecia que toda a gente, que ali desembocara de autocarro, ia assistir a algum velório. Era difícil ver um sorriso rasgado. Tudo muito concentrado e meditativo. Não creio que fosse apenas pela decepção de não se ter feito o passeio previsto, que naturalmente não deixara de se estampar em todos os rostos, mas sobretudo pelas imagens contrastantes que ali se nos deparavam - Era a tranquilidade do leito do rio onde as próprias nuvens se espelhavam, eram as verdes e maravilhosas encostas que ali se abrem, com os seus perfumes inebriantes e onde o lado selvagem coabita em perfeita harmonia com as típicas vinhas do Douro vinhateiro. Tudo isso era gracioso e inspirador de pensamentos poéticos e repousantes – Porém, a par disso, havia ali algo que era quase provocador.O estado de abandono da antiga estação de Almendra.
A do Côa já nem sequer tem telhado: é um autêntico pardieiro. Já ninguém se admira no que vai pelo interior. Mas ali a decepção ainda é maior – Pois, se por fora o edifício ainda apresenta ser habitável e funcional, quando se transpõem as portas (aliás, já arrancadas) o que se nos depara é a verdadeira imagem do desprezo, da incúria e da insensibilidade humana. Autêntico silêncio de sepulcros – Sente-se uma paz podre ao mesmo tempo que a imaginação nos conduz aos tempos em que por ali circulavam comboios: havia gente que esperava a hora da partida ou que acabava de chegar. Havia vida, azáfama e alegria. Agora vê-se o chão sem ladrilho, bocados da caliça das paredes e do tecto espalhados a mostrarem que ali o tempo parou e que a morte há já algum tempo ali começou.. Azulejos arrancados, arcadas sem uma porta. Salvam-se os desenhos e as inscrições dos grafites – Mas também eles o fiel retrato fidedigno de que o pensamento andou por ali atribulado ou a divagar. Daí compreender-se a tristeza que era impossível disfarçar no espírito de muitos daqueles que ali se deslocaram, não apenas como passeio, oportunidade sempre aprazível para espraiarem o olhar pelas belezas naturais das margens do Douro, mas como forma de protesto e de luta para que a velha estação possa vir a ser reparada e o comboio volte, por ali a circular, a entre o Pocinho e Barca D’Alva. - Seguiu-se depois um passeio a pé pela estrada até à ermida de Nossa Senhora do Campo - mesmo com alguma chuva pelo caminho, a estrada sempre nos poupava da molha nos pés e valia a pena a caminhada - A reportagem do programa por Alemendra e Castelo melhor, será apresentada noutro post.
Parabéns pela iniciativa - Venham mais: a par do abandono do património construído ou cultural há ainda outra ameaça não menor: a desertificação das nossas aldeias e centros urbanas do interior. E não podemos esperar que os governos se lembrem de nós: temos nós de lhe lembrar que existe um Portugal esquecido que não pode morrer ou continuar adiado. E nada melhor para o fazer que através do espírito associativo - Que é, no fundo, o trilho que tem tomado a novel Associação Foz Côa Friends
QUEM CORRE POR GOSTO NÃO CANSA - MESMO QUE TENHA DE SE LEVANTAR MAIS CEDO DE QUE O CANTAR DO GALO.
“Salvé” “Só os teus olhos me fazem sonhar e cagar” – Outra das muitas expressões e desabafos, que a arte dos corações mais sensíveis ou atormentados, não deixaram de ali perpetuar nas paredes brancas das várias instalações que constituíam a velha estação de Almendra – Talvez por isso, mas sobretudo pelo gritante contraste com a beleza envolvente, até parecia que toda a gente, que ali desembocara de autocarro, ia assistir a algum velório. Era difícil ver um sorriso rasgado. Tudo muito concentrado e meditativo. Não creio que fosse apenas pela decepção de não se ter feito o passeio previsto, que naturalmente não deixara de se estampar em todos os rostos, mas sobretudo pelas imagens contrastantes que ali se nos deparavam - Era a tranquilidade do leito do rio onde as próprias nuvens se espelhavam, eram as verdes e maravilhosas encostas que ali se abrem, com os seus perfumes inebriantes e onde o lado selvagem coabita em perfeita harmonia com as típicas vinhas do Douro vinhateiro. Tudo isso era gracioso e inspirador de pensamentos poéticos e repousantes – Porém, a par disso, havia ali algo que era quase provocador.O estado de abandono da antiga estação de Almendra.
A do Côa já nem sequer tem telhado: é um autêntico pardieiro. Já ninguém se admira no que vai pelo interior. Mas ali a decepção ainda é maior – Pois, se por fora o edifício ainda apresenta ser habitável e funcional, quando se transpõem as portas (aliás, já arrancadas) o que se nos depara é a verdadeira imagem do desprezo, da incúria e da insensibilidade humana. Autêntico silêncio de sepulcros – Sente-se uma paz podre ao mesmo tempo que a imaginação nos conduz aos tempos em que por ali circulavam comboios: havia gente que esperava a hora da partida ou que acabava de chegar. Havia vida, azáfama e alegria. Agora vê-se o chão sem ladrilho, bocados da caliça das paredes e do tecto espalhados a mostrarem que ali o tempo parou e que a morte há já algum tempo ali começou.. Azulejos arrancados, arcadas sem uma porta. Salvam-se os desenhos e as inscrições dos grafites – Mas também eles o fiel retrato fidedigno de que o pensamento andou por ali atribulado ou a divagar. Daí compreender-se a tristeza que era impossível disfarçar no espírito de muitos daqueles que ali se deslocaram, não apenas como passeio, oportunidade sempre aprazível para espraiarem o olhar pelas belezas naturais das margens do Douro, mas como forma de protesto e de luta para que a velha estação possa vir a ser reparada e o comboio volte, por ali a circular, a entre o Pocinho e Barca D’Alva. - Seguiu-se depois um passeio a pé pela estrada até à ermida de Nossa Senhora do Campo - mesmo com alguma chuva pelo caminho, a estrada sempre nos poupava da molha nos pés e valia a pena a caminhada - A reportagem do programa por Alemendra e Castelo melhor, será apresentada noutro post.
Parabéns pela iniciativa - Venham mais: a par do abandono do património construído ou cultural há ainda outra ameaça não menor: a desertificação das nossas aldeias e centros urbanas do interior. E não podemos esperar que os governos se lembrem de nós: temos nós de lhe lembrar que existe um Portugal esquecido que não pode morrer ou continuar adiado. E nada melhor para o fazer que através do espírito associativo - Que é, no fundo, o trilho que tem tomado a novel Associação Foz Côa Friends
1 comentários:
Uma excelente reportagem, escrita e com imagens para melhor documentar o que é a vontade férrea de um povo que resiste ao roubo de que foram vítimas.
A luta contínua e constante, quando a força da razão está do nosso lado, acaba sempre por dar frutos.
Ela pode ser longa, por vezes, parecer perdida, mas a razão tem forças poderosas que derrubarão as barreiras dos interesses e desinteresses daqueles para quem o país se resume a uma faixa longitudinal, à beira-mar implantada.
A minha solidariedade total com todos aqueles que sentem com emoção tudo o que viveram, sentiram e lhes está cravado no coração.
A força da razão vencerá!!!!.
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